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  • Fabio Juliate

Crime impossível e a errônea aplicação da Súmula 567 do STJ

Conforme bem define o Código Penal em seu art. 17, crime impossível é aquele em que, por ineficácia absoluta do meio ou por absoluta impropriedade do objeto, é impossível consumar-se o crime.

Entende-se por absolutamente ineficaz o meio empregado pelo qual se tem a total impossibilidade de consumação do crime, como, por exemplo, o agente que, com a intenção de matar, dispara contra a vítima utilizando-se de arma de brinquedo sem qualquer potencial lesivo. Ainda que a intenção do indivíduo seja de cometer o injusto, não há qualquer chance de que este ocorra.


Já em relação à absoluta impropriedade do objeto, define CAPEZ (2014, p. 275) que é a hipótese em que a pessoa ou a coisa sobre que recai a conduta é absolutamente inidônea para a produção de resultado lesivo. Tem-se, por exemplo, o caso em que a mulher, acreditando erroneamente estar grávida, realiza manobra abortiva.

Há ainda o entendimento jurisprudencial que trata como crime impossível aquele em que o agente pratica uma conduta delitiva induzida, encenada, ou provocada por policial ou agente provocador. Trata-se da figura de flagrante preparado, em que o indivíduo tem sua vontade influenciada para que cometa o crime. Tal entendimento encontra-se na Súmula 145 do Supremo Tribunal Federal, que se posiciona no sentido de que não há crime, quando a preparação do flagrante pela polícia torna impossível a sua consumação.


Importante destacar a diferença entre flagrante preparado e flagrante esperado. Enquanto naquele há a intervenção do agente provocador para que o indivíduo incorra na conduta delitiva, neste a atividade policial é a de apenas aguardar que ocorra o delito, sem influenciar ou induzir a conduta.

Nesse sentido, é pacífico o entendimento do STF (HC 78.250, rel. min. Maurício Corrêa, 2ª T, j. 15-12-1998, DJ de 26-2-1999) de que não caracteriza flagrante preparado, e sim flagrante esperado, o fato de a Polícia, tendo conhecimento prévio de que o delito estava prestes a ser cometido, surpreende o agente na prática da ação delitiva.


Ademais, surge a controvérsia acerca da tentativa de crime de furto ocorrida em estabelecimento comercial guardado por sistema de vigilância, ou que seja vigiado por equipe de segurança.

Em 2016 o Superior Tribunal de Justiça editou a Súmula 567, que possui o seguinte teor: Sistema de vigilância realizado por monitoramento eletrônico ou por existência de segurança no interior de estabelecimento comercial, por si só, não torna impossível a configuração do crime de furto.


Embora o texto da súmula não afaste de forma absoluta a possibilidade do reconhecimento de crime impossível nos casos em que o estabelecimento possua vigilância, as decisões atuais do STJ são taxativas exatamente no sentido de que tal situação não torna impossível a consumação do delito (AgRg no AREsp 1108487/PR; Rcl 35.311/RS; RHC 99.079/MG). Tal entendimento se mostra, na maioria dos casos, errôneo.

Ocorre que a existência de sistema de vigilância, alarmes nas saídas, seguranças espalhados pelo estabelecimento, ou outros meios de prevenção de furtos, por si só, podem, sim, tornarem impossível a consumação do delito, já que existência de tais mecanismos faz com que o patrimônio da possível vítima não esteja em risco em momento algum.


Nesse sentido, decidiu recentemente o STF em sede de habeas corpus (RHC 144516, Relator(a): Min. DIAS TOFFOLI, Segunda Turma, julgado em 22/08/2017, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-021 DIVULG 05-02-2018 PUBLIC 06-02-2018):


a forma específica mediante a qual os funcionários dos estabelecimentos exerceram a vigilância direta sobre os acusados, acompanhando ininterruptamente todo o trajeto de suas condutas, tornou impossível a consumação do crime, dada a ineficácia absoluta do meio empregado.

Embora a decisão vá de encontro com o sumulado pelo STJ, coaduna com os princípios norteadores do direito penal, em especial com o princípio da ofensividade, segundo o qual só deve ser considerada criminosa a conduta que ofereça perigo concreto e efetivo a bem jurídico tutelado.


Portanto, a tentativa de furto em estabelecimento comercial seguro e vigiado, em que há o total controle do ambiente e, por muitas vezes, o iter criminis é integralmente acompanhado, trata-se de crime impossível, uma vez que a conduta encontra-se isenta de qualquer lesividade em razão de sua absoluta impossibilidade de consumação.


REFERÊNCIAS


CAPEZ, Fernando. Curso de Direito Penal, volume 1, parte geral. 18. ed. São Paulo: Saraiva, 2014.


JESUS, Damásio de. Direito Penal, volume 1: parte geral. 33. ed. São Paulo: Saraiva, 2012.

BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal: parte geral 1. 24. ed. São Paulo: Saraiva Educação: 2018.

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